Bloom é uma plataforma que decodifica as raízes e as tendências do Brasil e América Latina.
O livro Bloom Brasil Saboroso, lançado em 2014, Bloom Fé, lançado em 2016 e Bloom a Terra chama, lançado em 2018, tratam de inspirações brasileiras e dos nossos vizinhos e analisam como elas influenciam e se relacionam nos variados setores, seja na moda, no artesanato, no design, na beleza, na arte ou no comportamento.
Através do olhar da renomada holandesa trend forecaster Lidewij Edelkoort, curadora dos livros, esta a constatação do nosso DNA brasileiro, que surge das raízes da nossa cultura, dos nossos ancestrais, o livro mostra referencias muitas vezes simples e singelas, que servem como fonte de inspiração para profissionais de diversas áreas.
Tratamos as variadas etnias brasileiras, que hoje absorvidas no dia a dia enriquecem a nossa cultura.
Trata-se de um projeto idealizado por Lili Tedde, representante do Studio Edelkoort South.
Seguem abaixo algumas histórias.
Bloom Brasil
A música característica vem também da floresta, com tambores e flautas e vozes xamanísticas que, com uma doçura ambrosíaca, narram a origem do planeta e o nascimento do homem. Pássaros raros e opulentos cantam o seu próprio refrão, descrevendo com um fervor alto o seu meio ambiente de dar água na boca. Frutas deliciosas de todas as formas e tamanhos fazem parte de um ritual diário de limonadas e sucos apetitosos. A floresta tropical é famosa por abrigar milhares de espécies desconhecidas de plantas, ainda a serem descobertas para a nossa saúde e prazer. Macacos dourados raros podem ser considerados ícones dos tesouros encontrados nessa terra: o petróleo rico, o milho doce, o abacaxi saboroso, o mel xaroposo e o próprio metal raro, fazendo desse país uma verdadeira terra onde corre leite e mel - agora também produzindo sorvetes. Uma destinação como um destino inevitável.
As flores exibicionistas que desenham a paisagem brasileira são abraçadas por palatáveis criaturas do mar que podem ser pescadas no litoral de sete mil e quinhentos quilômetros de extensão. A beleza e a fera são unidas para imaginar a terra saborosa da Amazônia; a ousadia de sua cor, a insolência de sua forma, a emoção de seu abraço suntuoso. Matando-me suavemente.
Plantas gordas e suculentas guardam a entrada para esse jardim de delícias; cheio de orquídeas exuberantes, orquestradas por beija-flores agitados e marimbondos murmurantes que voam ao seu redor. Flores primorosas crescem livremente, abraçando exuberantes árvores floríferas como um colar em um pescoço delgado. Também aparecem em retalhos de tecidos adoráveis, quase não vestindo a forma humana voluptuosa. As gramíneas ondulam com a brisa e convidam pessoas de todos os tipos e cores a usá-las em artefatos raros e ornamentais, para cobrir telhados, pisos e o corpo; o corpo divino com sua nudez picante e cachos sublimes de cabelo que se tornaram a marca registrada do Brasil, representado as raízes de sua cultura.
As raízes foram descobertas e recuperadas para dar à comida cor e energia locais. A palmeira prolífica divide o seu coração com todos nós, oferecendo pratos saborosos inacreditáveis diretamente do forno, inspirando formas improvisadas de cozinhar para o nosso futuro exuberante.
Inicialmente, fica-se até tonto com a variedade de etnias encontradas, uma amostragem humana sem igual. Senti-me desconfortável por não entender o que há de tão diferente nessa nação em relação a todos os outros países do mundo que conheci. Gradualmente entendi que o fato de não haver uma só raça ou cor dominante é que me dava esse sentimento de desorientação, que ter todas as origens igualmente representadas é algo raro e utópico, tornando essa nação a mais integrada do mundo. A mais bem-sucedida na criação de oportunidades em relativa paz. Uma vez reconhecido, esse fato me deu um sentimento de emoção e extrema felicidade de ter enfim encontrado um país onde todas as pessoas falam e cantam em uma só voz o orgulho de ser brasileiro.
Assim, a pele branca germânica é realçada por feições africanas escuras, misturadas com tons morenos indígenas e epidermes amarelas asiáticas. Os ancestrais portugueses falam através de uma tez mais escura, enquanto os italianos têm uma áurea bronzeada. A beleza árabe fosca se junta à pele judia translúcida em uma reunião de espíritos, embelezando essa coleção de cravos.
Eles estão aqui representados para dar-lhes as boas-vindas para este livro, retratados como testemunhas ampliadas de sua terra natal. Bem-vindos!
O espírito de abundância e de celebração é captado pelas guirlandas, as decorações vegetativas pendentes projetadas para simbolizar uma acolhida calorosa, feitas para decorar uma casa ou espaço público onde as pessoas se reúnem. Essas grinaldas clássicas são criadas de conchas, pedras, nozes, frutas e flores, combinando assim uma grande quantidade de matéria orgânica.
Amarradas com um barbante, funcionam como joias para ambientes interiores, que por sua vez se tornam enormes colares para ornamentar a gente bonita do Brasil.
Os materiais usados para esses objetos de celebração são humildes e domésticos, pimentas de papel, flores de plástico, contas de madeira, cabaças secas conchas catadas, contas coloridas e tecidos multicoloridos. Ingênuos por natureza e confeccionados por artistas populares, são testemunhas sedutoras de uma sociedade humilde e hospitaleira.
A generosidade de um país pode ser medida por suas guirlandas, assim como pela franqueza de seu povo. Nesse sentido, o Brasil é um país extraordinário. Como em nenhum outro lugar, reúne as pessoas como as pessoas montam uma guirlanda, conectando uma multidão de raças e cores, uma multiplicação de ancestrais que no passado deixaram sua terra natal em busca de aventura e ouro no Brasil sedutor.
Fruit Woman
Algumas espécies, mas selvagens, têm ainda uso ornamental. Crescem na floresta e nas ruas da cidade, alimentando gentilmente quem passa. Enquanto se espalham férteis, renovando o meio, parecem tomar gosto pela superexposição e pelo decorativismo. Das zonas úmidas e quentes dos trópicos brotam sementes de design intrigante e sedutor: o abacaxi, que carrega com majestade sua coroa verde; o maracujá, que guarda sementes vivas dentro de sua carapaça amassada; a banana hermeticamente fechada, com embalagem projeta para servir a qualquer momento. Durante o cultivo, boa parte das espécies cresce como trepadeiras, agarradas em cipós ou ligadas a arbustos e a falsos caules, multiplicando-se em cachos e pencas. Também despontam da terra, cheias de determinação e personalidade. O ritual da colheita começa cedo, com a primeira luz da manhã, exigindo cuidado físico e delicadeza, em longas horas nos pomares. Sua existência é por si só a confirmação de um ciclo de vida completo, triunfal. Então, sucessivamente, vêm a fecundação e o recomeço. Insistindo no frescor, na repetição do ciclo, apenas caminhando para o glorioso momento do abate, apanho, quando, enfim, o leite da vida está livre para escorrer.
A polpa deixa-se penetrar pelos dedos, aderindo, integrando, envolvendo todo tipo de sentimento, incluindo os táteis, viscerais e emocionais. Em reunião cromática e cinestésica, a pigmentação e o perfume dos elementos descascados emaranham-se em uma rede de vitalidade intensa.
Frutas suculentas e saborosas, de todas as formas e tamanhos nascem por aqui. Umas mais rijas e de casca firme e tensa, e outras, ao contrário, mais viscosas e brilhantes. Quando se despem das cascas, das folhagens e das sobreposições, ganham ainda em beleza e naturalidade. Dá para sentir o chamado apaixonado por um abraço, por um aperto. Apalpe aqui ou vá além: esprema devagar para ver a energia fluir em um caldo potente e rico em vitaminas para o organismo.
Do mel às fibras, as frutas podem ser trabalhadas para dar vida nova à pele, à mente, à existência. Seus sucos frescos são amplamente consumidos pelo povo brasileiro. Possuem também alto teor antioxidante, são fontes de fibras dietéticas, que limpam o corpo, ativam a regeneração celular, com propriedades digestivas e estimulantes. Delas, extraem-se óleos essenciais, que valem ouro para indústria cosmética, porque regeneram com entusiasmo e produzem notas aromáticas encantadoras.
Freak Folk
As cores são naturais como acústicos são os instrumentos, os detalhes são opulentos como barrocas são as letras e o clima geral é psicodélico, tanto na música quanto no design. Os hipnóticos sons atmosféricos são em geral decorrentes da força da improvisação, uma mentalidade de design “quebra-galho” que agora chega ao estilismo de moda, ajudando a criar uma visão mais divertida de como se vestir e como se des-comportar! Cada objeto encontrado pode se tornar uma espécie de acessório, zombando das ridículas peças “it” que têm definido a moda nas últimas décadas.
Também chamado de folk psicodélico, o estilo claramente apresenta um aspecto alucinógeno e surreal, basicamente pela discrepância hi-lo – modesto e corajoso, neutro e brilhante. Com sons incomuns e vozes de fora, ele provou ser resistente, o que pode ser um bom exemplo para a moda. Em vez de trocar de marca ou pular estações, os estilistas deveriam se dedicar a fazer um design desleixado de peças que funcionam bem no campo, mas que poderiam também fazer sucesso na cidade. Uma tendência cultural de deslocamento.
Como no movimento musical chamado de folk progressivo, a origem das criações de moda retratadas é tradicional e folclórica, repensando itens que por vezes existem há milhares de anos, usando detalhes feitos à mão e tecidos desenhados por artistas. Trajes de fazendeiros e aventais de ordenhadoras, assim como blusas rurais românticas e vestes gaúchas elegantes são usados com botas de borracha e luvas de jardinagem, que criam um acentuado contraste prático com as belas roupas rurais. Por mais estranho que pareça, tornam os trajes eróticos e fetichistas.
Como no ressurgimento do folk progressivo que ocorreu na virada do século passado, essa inovadora visão de moda progressiva chegou para dar maior peso cultural ao campo e diminuir a lacuna entre os dois estilos de vida em processo de hibridação, pois a cidade e o campo irão se fundir. O uso de cantos se reflete nos detalhes encantadores do tule e das fitas, assim como a música não ocidental ecoa nos materiais exóticos como a ráfia e o cânhamo, além de linhos rústicos.
Amazonas
A mulher como uma árvore e a árvore como uma mulher, ambas as espécies são espetaculares e imponentes, ambas são generosas e atenciosas. Estão todas unidas para manter a floresta viva. As mulheres coletam as castanhas escondidas no chão da floresta com seu próprio instrumento artesanal, o cambito, as transportam em paneiros e as distribuem para seu cliente preferido, a Natura, em seus próprios termos e tempo (lento). É um ritmo humano lento, que torna os produtos derivados da castanha holísticos e preciosos, perpetuando receitas antigas de poder medicinal. No mercado, as mulheres vão comercializar as castanhas, trocá-las por peixe e produtos agrícolas. Sua comunidade é unida e vive dos produtos da terra. A mãe terra continua a doar, pois distribui seus frutos aos habitantes da Floresta Amazônica, e chora por cada árvore sacrificada para a construção de estradas e edifícios. Fica sem fôlego em imaginar como a espécie humana quer derrubá-la e matar o meio ambiente.
É um mundo verde das mulheres.
No meio da mágica floresta tropical, as amazonas adentram juntas para coletar as castanhas da abundante e imensa castanheira, a rainha da floresta, todas elas são rainhas da floresta. Uma das mais antigas e imponentes árvores, que pode chegar a quase setenta metros de altura e viver por centenas de anos, e são as mulheres mais velhas que mandam no vilarejo, nos seus maridos e trabalhadores. Essas mulheres vêm de uma longa linhagem de características femininas fortes e sabedoria inata, adquirida durante séculos. São duras como uma noz, independentes e com autoridade natural, formam uma sociedade matriarcal. A abundância das árvores se assemelha à empatia das mulheres e ao respeito pelas tradições das famílias de cada uma. Os frutos da árvore, chamados ouriços, são fonte de proteína consumida em formato sólido ou líquido. Com as próprias mãos, as mulheres prensam as castanhas para extrair o leite, com características nutricionais. O óleo tem propriedades hidratantes e é usado para manter suas tranças lindas e fortes. Os ouriços orgânicos são também usados para fazer bijuterias, para adornar vestidos simples em uma referência antiga das amazonas. São extremamente protetoras de sua boa aparência e cuidam de sua beleza contemplada.
As mulheres trabalhadoras só podem entrar na clareira no inverno, quando todos os frutos já caíram, pois se um fruto cair e atingir alguém pode ser fatal. Leva sete dias de viagem em uma canoa grande para chegar lá, ultrapassando corredeiras, com barcos grandes que podem carregar até cem sacos de castanhas de volta para a chamada civilização. A coleta ocorre no meio da floresta, rio acima, em direção às terras secas. As mulheres montam o acampamento perto da floresta escolhida, carregando o suficiente para sobreviver por dois meses; transportam querosene, sal, farinha, redes, ferramentas, lonas, facões, botas e temperos, é claro. Totalmente independentes e com apenas martelos e pregos, as amazonas constroem uma barraca improvisada com um encerado e lenha catada no local. Aqui é a casa da Teresa, ali é da Maria, mais para a frente é a floresta da Lucinete; os locais de acampamento e coleta foram naturalmente distribuídos há muitas gerações, todos sabem seus lugares e respeitam os dos outros.
Assim como suas legendárias xarás da mitologia grega, as mulheres ferozes são guerreiras da sobrevivência, levando a vida em seus próprios termos, fundando vilas e vilarejos, estabelecendo e cumprindo regras. É apenas para quebrar as castanhas que pedem ajuda aos homens, pois são elas que coreografam o processo de coleta. São as chefes e gostam de escolher quebra-nozes bonitos e fortes, mas capazes de lidar com seu poder feminino. Os trabalhadores ficam na labuta enquanto elas descem o rio até o comércio da cidade. Bater os sacos de um lado para o outro demanda força muscular e resistência mental. Reunir-se com os bancos e clientes exige visão estratégica e tino comercial. Elas planejam e traçam o ritmo do trabalho, e o passo da produção. Elas é que mandam.
São mais felizes na natureza do que na cidade, preferem o trabalho manual à produção industrial. As amazonas coletam cerca de trinta a quarenta paneiros, terminam o dia de trabalho e chamam os homens para ajudar na quebra até o pôr do sol. Nessa hora mágica do crepúsculo, os paneiros são levados para o rio para a lavagem das castanhas. As vazias boiam na superfície e são descartadas, em um controle de qualidade natural. Quando termina a temporada, elas vão para casa, não há nada em que se ocupar além de plantar mandioca para fazer farinha e flores para fantasiar.
Algumas mulheres adoecem no verão por falta de trabalho.
Elas vão de lá para cá entregando a coleta e trazendo de volta produtos frescos para sua sobrevivência. Caçam pequenos animais, como pássaros e veados, às vezes até antas. Não só os humanos, mas também os animais que se deliciam com as castanhas nutritivas e são responsáveis pela dispersão das sementes para assegurar a regeneração das mudas jovens. As cutias enterram as sementes e depois se esquecem do esconderijo, criando novos retalhos de esperança para florestas futuras. Assim como as novas mudas que tomam forma, as adolescentes vão com as mães para aprender a montar um acampamento e ajudam na coleta, em uma tradição geracional de trabalho sazonal. Elas coletam e constroem e cozinham milharina para fazer um mingau grosso ao nascer do sol antes de sair para a coleta. Usam o que têm, lenha para fogueira, ervas para saúde, castanhas para beleza, frutas para vitamina, animais para energia, e água do rio. Plantam goiaba e maracujá e chamam seu lugar de sítio.
Elas vão de lá para cá entregando a coleta e trazendo de volta produtos frescos para sua sobrevivência. Caçam pequenos animais, como pássaros e veados, às vezes até antas. Não só os humanos, mas também os animais que se deliciam com as castanhas nutritivas e são responsáveis pela dispersão das sementes para assegurar a regeneração das mudas jovens. As cutias enterram as sementes e depois se esquecem do esconderijo, criando novos retalhos de esperança para florestas futuras. Assim como as novas mudas que tomam forma, as adolescentes vão com as mães para aprender a montar um acampamento e ajudam na coleta, em uma tradição geracional de trabalho sazonal. Elas coletam e constroem e cozinham milharina para fazer um mingau grosso ao nascer do sol antes de sair para a coleta. Usam o que têm, lenha para fogueira, ervas para saúde, castanhas para beleza, frutas para vitamina, animais para energia, e água do rio. Plantam goiaba e maracujá e chamam seu lugar de sítio.